sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O valor das trocas interculturais



Quando no século XVII os judeus portugueses foram expulsos de Portugal vieram para a Holanda e aqui floresceram à sombra de leis benignas e tolerantes.
Aos judeus portugueses ninguém perguntou de onde vieram, nem por que vieram. Eram bem-vindos. Tiveram grande importância no desenvolvimento cultural e económico da Holanda. Desta congregação constavam rabinos, estudiosos, pensadores, artistas, banqueiros, os fundadores e gestores de grandes casas de comércio internacional.
Praticavam livremente a sua religião e em 2 de Agosto de 1675, inauguraram a Sinagoga Portuguesa em Amesterdão. Uma proteção única, de facto!
Nos anos 60 e 70 do século passado a Holanda ofereceu também abrigo a refugiados políticos e trabalhadores migrantes que em Portugal não podiam viver, os primeiros devido ao regime político vigente – a ditadura de Salazar e os segundos procuravam por razões económicas trabalho fora do país. Em 22 de Novembro de 1963 foi assinado um Tratado de Recrutamento (Wervingsverdrag) entre Portugal e a Holanda.
A Holanda era conhecida como um país tolerante, progressivo e acolhedor.
Desde que cheguei à Holanda em 1988 ouço muitas discussões sobre o direito dos estrangeiros de preservarem a própria cultura, de falarem ou não a língua mãe, e em particular sobre o uso do véu islâmico e sobre as práticas e crenças dos islamitas.
Nunca entendi a exagerada comoção em torno destes temas.
Como "produto" de diferentes culturas sei lidar com "outros". Conheço os gestos, símbolos, cores, imagens e outros símbolos de outros países, culturas e religiões. Devido à minha descendência, às questões coloniais e migratórias fui obrigada a conviver com povos de diferentes proveniências culturais. De uma forma positiva apreendi muito com isso.
Os intercâmbios culturais são para mim óbvios e fazem-se notar nos estilos musicais, na gastronomia, nas indumentárias, na forma de negociar e nas tecnologias.
Relacionei-me desde muito pequena com goeses, moçambicanos, portugueses e muçulmanos. Resumindo: sou descendente de uma família indo-portuguesa. Nasci em Moçambique e após a independência deste país em 1975, começou uma guerra civil obrigando-nos (a mim e à minha família) a emigrar para Portugal onde vivi de 1980 a 1988 e de então para cá, vivo na Holanda.
Não estou de acordo quando se afirma que os estrangeiros deviam assimilar a cultura holandesa e assinar o "contracto de assimilação". Para mim, a palavra assimilação tem uma carga negativa. Após a independência de Moçambique, percebi que a assimilação nos tempos coloniais foi usada para oprimir o povo. Os negros tinham os mesmos direitos que os brancos desde que provassem ser civilizados. Para obter o cartão de assimilação os negros tinham que provar que viviam como os europeus, que pagavam impostos, que tinham cumprido o serviço militar, que gozavam de estabilidade económica e que tinham um nível acima da média portuguesa (isto é, deviam ler e escrever corretamente o Português).
Desde 11 de Setembro de 2001, tem-se dado ênfase à assimilação em vez de integração. Enquanto nos anos 60 do século passado deixaram as pessoas viver aqui e a sociedade holandesa não se preocupou com o futuro das comunidades migrantes, hoje em dia os políticos acham que a integração deve ser rápida e compulsiva. Não me parece correcto uma vez que a integração é uma aprendizagem que requer tempo. O tempo necessário para apreender a língua e cultura varia consoante a pessoa e a cultura de origem.
Concordo que os estrangeiros devem aprender a língua e cultura holandesa o mais rapidamente possível, para bem pessoal e da sociedade onde se querem inserir. A meu ver o país fica também enriquecido com a diversidade cultural, com a comunicação intercultural, com os diálogos inter-religiosos e com os intercâmbios culturais. Por isso é importante que os políticos e os meios de comunicação social não contribuam negativamente acentuando os estereótipos e os preconceitos que dificultam a comunicação entre diferentes grupos étnicos e sociais.
Neste mundo globalizado, a riqueza de línguas e culturas tem um valor económico.
Cabe-nos extrair a riqueza da diversidade!